quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

 
ESPANTOSO ESPANTO 


Observando a quietude impoluta
deste início de tarde outonal,

o céu de um profundíssimo azul,
o sol de um glorioso brilho,
as nuvens, em pinceladas largas,
navegando em transatlântica suavidade
pela serena frescura do ar,

na amenidade deste dia maravilhoso,
contando os aviões em diferentes lonjuras,
altitudes e direcções, que sulcam rectas
perfeitas, de um branco puro e luminoso,

volta a espantar-me o contraste,
a estranheza do simples facto
de que nesta plácida hora
em que apenas o leve rumor das folhas
agita candidamente a paisagem,

neste quietíssimo minuto
em que só a brisa belisca ao de leve
a poética composição espácio-temporal,

neste exacto segundo
em que desenho caprichosamente
as palavras reveladoras do meu espanto,

a Terra, este planeta em cujo solo
tão confiadamente assentamos os nossos pés,
roda, gira e rodopia sobre si mesma,
a estonteante velocidade, em redor do Sol
e do centro de uma galáxia em rotação,
por um universo infinito em contínua expansão!

Espantoso espanto? Sem dúvida!
Se sempre o soube, se sempre
racionalmente o compreendi,
donde a surpresa e o assombro?

Dupla incongruência
da misteriosa natureza das coisas... 

Ilona Bastos